quarta-feira, 23 de setembro de 2009

As cotas numéricas e nossa realidade Social

Evilásio Pereira Rocha

No Brasil, quando se fala em cotas numéricas imediatamente volta-se as atenções para as cotas afirmativas para afro-descendentes nas instituições de Ensino Superior, embora a nossa pretensão seja discutir essa problemática achamos importante, lembrar que a Lei 3198/00 (Estatuto da Igualdade Racial) no seu artigo 52 estabelece a cota mínima de 20% para a população afro-brasileira vagas relativas também a outras áreas, a saber: concursos públicos e contratos do Fundo de Financiamento do Estudante do Ensino Superior (FIES) alem de alterar outra Lei (95404/97) no que diz respeito ao numero mínimo de candidatos negros a ser reservado pelos partidos e coligações políticas, ademais, existem outras leis as quis determinam cotas seja para mulheres (no caso das candidaturas políticas), seja para deficientes físicos (concurso público), ainda o Estatuto da Igualdade Racial, prevê uma cota mínima de 20% para afro-brasileiros em empresas com mais de vinte empregados.
Por que as cotas para preenchimento das vagas nas instituições de ensino superior causam tanta polemica? Vejamos. “No Brasil o conceito de raça encontra-se mais relacionado a cor da pele e traços faciais do que à ancestralidade. Isso levou alguns estudiosos a analisar a classificação racial brasileira não enquanto grupos raciais mas sim grupos de cor” (DEGLER,1991 Apud HERINGER 2002); no parecer da Relatora Petronilha Beatriz Gonçalves Silva do Conselho Nacional de Educação (CNE) no qual instituiu as Diretrizes para o Ensino da Cultura nas escolas, a mesma ao tratar das políticas de reparação fala sobre a demanda da comunidade afro-brasileira por reconhecimento afirma que reconhecer, dentre outras coisas “implica em criar condições para que os estudantes negros na sejam rejeitados em virtude da cor de sua pela” ( BRASIL, 2005 p.12), paradoxalmente o censo brasileiro pede as pessoas que se classifiquem dentro de uma categoria de raça – a já citada relatora do CNE afirma que “ se entende por raça a construção social forjada nas tensas relações entre brancos e negros, muitas vezes simuladas como harmoniosas, nada tendo a ver com o conceito biológico de raça cunhado no século XVIII e hoje sobejamente superado” ( BRASIL, 2005 p12) diante disto e visto não termos encontrado o termo etnia em nenhum dos documentos oficiais que consultamos, estamos usando o ( sem demagogia) o termo raça neste texto – onde se constatou que, segundo a auto-declaração, pretos e pardos constituem 45,3% da população brasileira (HERINGER,2002), da mesma forma, o sistema de cotas adota a auto-declaração como critério para ter direito as mesma, ou seja, se um individuo no ato da inscrição se declarar afro-descendente e preencher outros requisitos automaticamente ele será beneficiado pelo sistema, a duvida é quem garante que a mesma pessoa que se declarou branco na pesquisa do IBGE, não irá se declarar, por uma questão de conveniência, negro na hora de preencher um cadastro para fazer o vestibular?
Somos favoráveis ao sistema de cotas pois, embora consideramos que o ideal seja uma escola publica de qualidade e que proporcione ensino de alto nível às minorias carentes e possibilite aos mesmos disputar as vagas na universidade de igual para igual com aqueles que tiveram a oportunidade de passar por instituições onde o ensino já é considerado mais eficiente. Estamos conscientes de que isto só se dará a longo prazo, todavia a situação exige medidas urgentes, e a curto e médio prazo, o sistema de cotas parece ser a solução mais viável. No entanto somos contrários ao critério de auto-declaração de raça, visto que o Estado reconhece a multiplicidade que caracteriza nossa população, inclusive – no campo da educação – a Lei de Diretrizes e bases é clara ao lembrar a contribuição das diversas matrizes na constituição da nossa sociedade ( Lei 9394/96 art. 26 parágrafo 4º), achamos viável que ele utilize critérios que definam quem é negro e quem é branco e outras raças que constituam a nossa população.

Referencias Bibliográficas

BRASIL. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação das Relações Étnico-Raciais e Para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Africana – MEC/SEPIR Brasília DF. 2005

GARCIA, Januário (Org.) : 25 anos 1980 – 2005 Movimentos negros no Brasil – 1ª Ed. – Brasília DF. Fundação Cultural Palmares, 2006

HERINGER. Rosana - Desigualdades Raciais no Brasil: síntese de indicadores e desafios no campo de políticas públicas. Disponível em www.espacoacademico.com.br. Acesso em 31 de janeiro de 2007

LEI 3198/00 Que Institui o Estatuto da Igualdade Racial

PEREIRA, Amauri Mendes. Historia e Cultura Afro Brasileira: Parâmetros e Desafios. Disponível emwww.espacoacademico.com.br. Acessado em 30.01.

Geração CTRL C CTRL V


Evilásio Pereira Rocha*
evilasiorocha_ftc@yahoo.com.br


Posso me considerar um sujeito felizardo, pois sou daqueles que nunca desprezam uma boa leitura, acredito que a leitura mais prazerosa é aquela espontânea, sem compromisso, sem prazo, sem cobrança, é a leitura pelo prazer de ler. Comecei ler ainda criança e a minha iniciação nesse mundo se deu pelas revistas em quadrinhos as quais eu lia escondido dos meus pais, pois os mesmos eram pessoas simples, dedicadas ao labor e como não tiveram a oportunidade de acesso a educação formal, desconheciam a importância do ato de ler para a formação intelectual do aprendiz. Hoje, passados alguns anos desde a tenra idade continuo “viciado” em uma boa leitura que vai desde as velhas estórias em quadrinhos aos grandes clássicos da literatura universal, perpassando pelas crônicas, contos e poemas, os quais nos são acessíveis das maneiras mais simples imagináveis. – Mas, e as velhas revistas em quadrinhos onde estão? Nas bancas de jornais que antes eram sinônimos dessas publicações, encontramos facilmente revistas de fofocas, pornografia, encartes diversos e até jogos eletrônicos, encontramos também as revistinhas... escondidas em algum canto onde somente com muita persistência podemos encontra-las. A diminuição da importância das revistas em quadrinhos para os comerciantes do ramo é diretamente proporcional ao interesse que ela desperta no publico jovem e isso reflete uma verdade que me angustia profundamente: nessa sociedade tecnológica onde impera os jogos eletrônicos e as lan houses nossa juventude está deixando de ler.
Como professor, pude perceber isso ao passar alguns trabalhos de pesquisa para meus alunos, trabalhos estes que evidentemente exigiam uma leitura acerca do tema pesquisado, tal foi a minha surpresa quando as “pesquisas” chegaram as minhas mãos, em sua maioria, eram textos retirados da Rede Mundial de Computadores, muitos dos quais nem sequer se deram ao trabalho de fazer a formatação. Angustiado com essa realidade passei a prestar mais atenção ao comportamento dos nossos estudantes e dia desses quando estava em uma das casas de acesso a internet de nossa cidade testemunhei o seguinte dialogo entre um estudante da Escola Estadual Senador Pedro Lago e o jovem funcionário da casa:
- Eu quero fazer uma pesquisa.
- Sobre o que?
- Sobre a Reforma de Lutero.
Como um grande intruso, que, aliás, não sou, falei para o estudante que era a Reforma Protestante, mas ele foi incisivo ao falar:
- Não é essa daí que eu quero, quero a Reforma de Lutero.
Resignado me recoloquei a parte do dialogo, mas tive tempo de ouvir o atendente – que pela idade aparente também devia ser estudante – tranqüilizar o nosso intrépido pesquisador ao dizer:
- Ah. A Reforma de Lutero eu tenho aqui.
E redimensionando uma pagina da Internet que já estava aberta, imprimiu em duas folhas de ofício as quais entregou ao seu interlocutor que perguntou:
- Quanto é?
- São dois reais.
Satisfeito e com a sensação de tarefa cumprida, nosso amigo pagou os dois reais e saiu com a sua “pesquisa” pronta. Espero que ele tenha tido a sapiência de colocar ao menos o cabeçalho com o nome da escola e principalmente com o seu nome para diferenciar sua “pesquisa” das demais que com certeza iriam com o mesmo conteúdo. Ou alguém pode explicar por qual outro motivo o rapaz da lan house já tinha uma pagina aberta com a “Reforma de Lutero”?
Iniciei este artigo falando das revistinhas em quadrinhos, pois, acho que nenhuma criança vai começar tomar gosto pela leitura a partir dos grandes clássicos da literatura brasileira e universal. O processo deve ser gradativo, perpassar por leituras fáceis e prazerosas para despertar dentro de nossos jovens o prazer de ler. Como professor, acredito que a escola tem papel fundamental na formação do leitor, ademais é fato que antes de formarmos bons pesquisadores, temos que formar bons leitores, ou então a sociedade moderna irá se confrontar com um novo fenômeno sociológico: uma demanda por conteúdos “prontos” no universo virtual, e desta forma tal qual fazemos com os remakes das novelas da Rede Globo, teremos que nos acostumar com a falta de criatividade – e de leitura – dos nossos jovens “pesquisadores”. Isto me faz lembrar um dos maravilhosos contos de Andersen: O Rouxinol e o Imperador da China, pois por mais que nossos alunos consultem o mundo virtual para colher suas “pesquisas” sempre haverá o homem inteligente por trás da máquina – leiam o conto, vejam a parte do pássaro mecânico e entendam por si só. A situação vivenciada na lan house, juntamente com o fato de meu sobrinho de apenas 11 anos e cursando a 5ª série sempre me pedir algum trocado para ir “fazer pesquisa na internet”, me faz sentir saudades do meu tempo de estudante quando íamos pesquisar na biblioteca, e a mesma lembrança nostálgica me faz sentir um pouco de pena dessa geração, a geração CTRL C CTRL V.

*Licenciado em História pela Faculdade de Tecnologia e Ciências – FTC.
Ex professor substituto do Centro Educacional Municipal João Câncio.
Diretor da Escola Municipal Anália de Almeida Souza Lima.